quarta-feira, 14 de janeiro de 2015

Não sejamos Annitas!



Este é mais um texto em primeira pessoa. Ttrata-se de um assunto no qual não possuo nenhum distanciamento, já que sou um indivíduo assumidamente gay que defende a bandeira da igualdade. Problematizarei, aqui, valores machistas e misóginos que vigoram, principalmente entre os homossexuais masculinos, na comunidade LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transgêneros).
Atualmente, fomentado pelas grandes mídias de informação, o tópico “machismo” tem recebido grande destaque nos debates sociais, tendo em vista acontecimentos como a discussão entre as cantoras Anitta e Pitty, no programa de TV Altas Horas, da Rede Globo. Em uma fala polêmica, Anitta afirmou que a mulher, num paradigma profissional, alcançou os mesmos direitos que os homens e que, atualmente, elas estão exagerando em querer tomar o lugar deles em determinadas situações. Diante de tal fala, Pitty rebateu dizendo que as mulheres não atingiram os mesmos direitos que os homens. Por fim, Anitta refletiu (equivocadamente), segundo as suas observações, que as mulheres não se dão o respeito, em virtude de terem uma abordagem diretiva e sexualmente ativa frente aos homens. Como resposta, Pitty disse que as mulheres não têm que se dar o respeito, mas que os homens devem respeitá-las independentemente de qualquer situação ou atitude.
Ora, são nítidos os problemas no discurso de Anitta. Em primeira instância, podemos identificar a contradição da cantora, pois, se analisássemos isoladamente seu trabalho com a lente machista que vigora em nossa sociedade, concluiríamos que ela também não se dá o respeito. Uma mulher que lança mão de danças sensuais, figurinos ousados e canções que parecem revelar uma (aparente) construção identitária feminina empoderada, emancipada e transgressora, não poderia ter um posicionamento tão conservador e contraditório e sair incólume desse tipo de debate, afinal.
Esse exemplo, no entanto, nos permite deslocar a reflexão acerca do machismo para o universo LGBT, já que, frequentemente, nos deparamos com casos graves de preconceito e segregação dentro de um grupo já marginalizado, como o nosso.
O gays efeminados, as transsexuais, as drag queens, por se apropriarem de signos femininos em sua identidade de gênero ou em sua esfera cultural, são rotulados pejorativamente pela própria comunidade. Assim, são rotineiras as seguintes falas e referências em situações comunicativas cotidianas: “bichinha”, “passiva”, “afeminada”, “trava”, “maricona”, “odeio mulher”, etc.
Podemos inferir, a partir desses casos, um ódio a todo e qualquer índice de feminilidade assimilado por essas pessoas. Quer dizer, em outras palavras, que existe, no âmbito gay, uma forte misoginia e machismo. É relevante destacar, com isso, que os gays (principalmente os masculinos) não estão isentos do machismo corrosivo e nocivo que considera a mulher inferior ao homem, devendo, portanto, elas se subordinarem a eles.
Após essa constatação, não podemos fechar os olhos para tamanho absurdo, pois não deveriam haver hierarquias entre o nosso grupo, considerando que compartilhamos da mesma causa: a luta por direitos civis igualitários em um corpo social héteronormativo e excludente. Com esse tipo de comportamento, além de engrossar a marginalização de conjuntos minoritários, estamos sendo igualmente ignorantes com os nossos companheiros.
Acredito que enquanto não houver essa conscientização e unificação, não seremos uma força capaz de promover mudanças positivas para  nossa comunidade. O gay de voz grossa/ machão/ bombadão não é superior ao gay afeminado e à transsexual. Não sejamos contraditórios, porque, com essa postura, estamos legitimando preconceito e ódio.

Esta é a voz angustiada de um gay que se assusta e não consegue engolir essa realidade. Não dá mais para sermos Anittas.

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